Empoderamento ou estereótipo: a sensualidade nas campanhas publicitárias
- Carlos Lidovinio

- 8 de set. de 2024
- 6 min de leitura
Atualizado: 9 de ago.

A sensualidade na publicidade de moda: estratégia ou puro apelo?
Vamos falar sobre uma técnica que você certamente já viu (e talvez nem tenha percebido): o uso do apelo sensual na publicidade. Desde que o mundo é mundo, ou melhor, desde que a publicidade é publicidade, o “sexy” vende. Mas como isso começou, e como evoluiu até chegarmos aqui? (2024). Vamos, juntos, explorar como o apelo sensual se consolidou e entender por que ele continua sendo uma ferramenta poderosa no arsenal dos publicitários.
O “Sexy Sells”: uma breve retrospectiva
Se você der uma olhada nas campanhas das últimas décadas, vai perceber um padrão. Pense nas propagandas da Calvin Klein nos anos 90. Quem nunca viu uma daquelas campanhas com modelos em poses provocantes? Ou as campanhas de perfumes, que vendem uma atmosfera cheia de desejo? Não é o produto em si que está em destaque. É a imagem, o conceito. E isso é utilizado até hoje.
Não parece que as marcas se viciaram em sexualizar os perfumes? (hm)
Esse uso do corpo e da sensualidade começou a ganhar força porque, convenhamos, chamar a atenção é a primeira missão de qualquer publicidade. E o apelo visual sexual tem esse poder instantâneo.
Baseado em várias teorias e estudos sobre psicologia, publicidade e comportamento do consumidor, podemos dizer que o apelo visual sexual tem um poder instantâneo sobre as pessoas devido a uma combinação de fatores instintivos e socioculturais. Evolutivamente, os estímulos sexuais acionam respostas emocionais rápidas e memórias duradouras, pois estão ligados a sinais de saúde e fertilidade. Culturalmente, a sensualidade é associada a poder e status, tornando os produtos que a utilizam mais desejáveis.
Além disso, a exposição constante a esses conteúdos na mídia reforça a eficácia dessa abordagem, criando uma aceitação generalizada e uma forte conexão emocional com a marca ou produto.
Mas será que as marcas estão vendendo só o produto?
Não, isso branding, experiência, chame como preferir.
Marketing ou ilusão? O consumo de símbolos
Vamos a mais teoria. Em campanhas que fazem uso de apelos sensuais, raramente estamos falando apenas de um item de consumo. Estamos vendendo um estilo de vida, um ideal de beleza, poder ou desejo. Jean Baudrillard, um dos grandes teóricos da comunicação, já dizia que, na sociedade de consumo, os produtos se tornam símbolos. No caso dessas campanhas, não estamos comprando só um jeans ou um relógio, estamos comprando a promessa de ser aquela pessoa, de pertencer àquele mundo.
Então, quando vemos uma propaganda da Dolce & Gabbana, toda trabalhada na sensualidade, o que a marca realmente quer vender? A peça de roupa ou o estilo de vida glamouroso, sexy-Italy e desejável que ela representa?

Analise a imagem da campanha de Dolce, e pense: até onde vai a linha entre sedução e objetificação?
Em 2007, a marca de luxo Dolce & Gabbana, foi duramente criticada por tentar veicular uma campanha que incitaria violência sexual a uma mulher, rodeada de homens sem camisa.
Segundo o site terra.com.br, “o anúncio foi proibido em publicações italianas, pois entendeu-se que ele ofende a dignidade da mulher. Ele também foi retirado nos Estados Unidos após uma única aparição na Revista Esquire”.
Onde está o limite? (se é que há um) (...) (risos)
Agora, é importante entendermos que o uso da sensualidade na publicidade também levanta algumas questões éticas e sociais. Assim como vimos no caso da Dolce & Gabanna. (ATENÇÃO).
A Axe (marca de desodorantes francesa) (da Unilever), por exemplo, foi fortemente criticada por campanhas que sugeriam que as mulheres eram quase "prêmios" para os homens que usassem seus produtos (desodorantes perfumados). Esse tipo de abordagem levanta debates sobre como a publicidade retrata gêneros e relações de poder.
Não se pode ofender nenhum indivíduo em troca de buzz.
Nesse caso, seria: os homens quererem tal produto com a promessa de que eles seriam tão desejados quanto os homens daquela propaganda, por (simplesmente) usarem o mesmo desodorante. Ou seja, tentando atrair um público, a marca acabou ofendendo a outro.
Hoje, as marcas estão cada vez mais atentas às críticas. O público não aceita mais a velha fórmula de corpos perfeitos, exclusivamente brancos e com padrões quase inatingíveis (naturalmente). Diversidade, inclusão e representatividade se tornaram elementos fundamentais para que as campanhas sejam bem-recebidas.
Mas, isso não é segredo para ninguém, e se for novidade para você, com certeza está vivendo no momento errado.
Abercrombie & Fitch: quando a sensualidade é a própria marca (case/exemplo)

Não dá para falar de apelo sensual sem mencionar a Abercrombie & Fitch. Nos anos 2000, a marca foi praticamente sinônimo de corpos esculturais, festas exclusivas e um estilo de vida sexy. Suas lojas eram cheias de modelos sem camisa (os famosos padrões).
A Abercrombie vendia mais do que roupas, vendia um ideal de juventude e beleza inalcançável para a maioria. E vendia muito! Filas, filas e mais filas em suas modernas lojas.
Essa estratégia funcionou por um tempo, mas também teve seu preço. As críticas começaram a surgir, especialmente em relação à falta de diversidade nas campanhas e à exclusividade de uso de corpos padrão. O ápice da controvérsia veio com os comentários do ex-CEO, que admitiu que a marca era feita “para pessoas bonitas”. Isso manchou a reputação da Abercrombie e mostrou os limites de uma estratégia que focava demais no visual e de menos em inclusão. O que foi uma grande coisa, já que, a inclusão social ainda estava apenas começando a ganhar força na área de publicidade de massa.
Agora, em 2024, a marca passou por uma reinvenção. Eles “abandonaram” o elitismo e apostaram em uma abordagem mais inclusiva, com campanhas que mostram diversidade de corpos, etnias e estilos. (não muito) (risos). O apelo sensual ainda está lá, pois isso é a marca, mas, de uma forma mais conectada com os valores do “consumidor atual”.
Victoria's Secret: sensualidade, críticas e reinvenção (mais um case/exemplo)

A Victoria's Secret usou o apelo sensual com desfiles glamorosos e campanhas visualmente impactantes para criar uma imagem de exclusividade e sedução. No entanto, a marca enfrentou um "cancelamento" cultural devido à falta de diversidade e inclusão, bem como a comentários controversos de seus executivos.
Contudo, a Victoria's Secret está se reinventando em 2024 com um foco maior em diversidade e empoderamento. A marca, agora, promove uma gama mais ampla de tipos de corpos e identidades (assim como a Rihanna faz com a Savage x Fenty, sua marca underwear), e está reformulando suas campanhas para destacar conforto e autenticidade, além de sensualidade.
Agora, vejam como a massa pode, sim, mudar a direção de uma marca global inteira, quando essa se posiciona de forma que fira a algum indivíduo (massa). A massa cobra humanização. Nem sempre isso dá certo, mas, é assunto para outro momento. (risos).
Marcas brasileiras: sensualidade e Empoderamento
Vamos analisar como algumas marcas brasileiras utilizam a sensualidade de forma branda para empoderar e destacar suas campanhas:
Pat Bo: A PatBo é conhecida por suas campanhas que exploram a sensualidade de maneira sofisticada e empoderadora. A marca usa a sensualidade para destacar a força e a confiança de suas clientes, criando um visual que é ao mesmo tempo elegante e provocante. A sensualidade aqui não é apenas uma característica estética, mas um meio de transmitir uma mensagem de empoderamento e autoestima.

Animale: A Animale também se destaca pelo uso da sensualidade em suas campanhas. A marca sabe como utilizar o apelo sensual para celebrar a mulher moderna e autêntica. As campanhas da Animale frequentemente mostram mulheres seguras de si e com atitude, refletindo uma sensualidade que vai além do visual e se conecta com a força interior da mulher.

O futuro do apelo sensual
A grande pergunta que você, como comunicador/comunicadora, precisa fazer é:
Esse tipo de apelo funciona para a minha campanha?
Será que os consumidores estão realmente comprando por conta da sensualidade ou estão cansados de ver sempre os mesmos estereótipos?
A linha entre gerar desejo real e criar uma ilusão inalcançável é bem tênue. O apelo sensual ainda tem espaço na publicidade, mas a forma como ele é usado está mudando. Hoje, a publicidade precisa equilibrar sensualidade com autenticidade e realidade. Não basta mais criar imagens provocantes, é necessário engajar o público com narrativas que façam sentido, que representem a realidade diversa em que vivemos.
Então, quando estiver pensando nas campanhas que vai criar no futuro, se pergunte:
O que realmente estou vendendo, o produto ou a ideia que ele carrega?
Isso vai ajudar a ir por um caminho mais assertivo, fugindo de uma possível generalização.
Fontes:
Resenha do capítulo “A Sedução Publicitária”, do livro “Televisão Subliminar” de Joan Ferrés, por Josué Brazil
Artigos sobre o cancelamento e reinvenção da marca Victoria’s Secret podem ser encontrados em: The New York Times, Forbes e Business Insider.
"The Psychology of Advertising" de Bob M. Fennis e Wolfgang Stroebe. Este livro explora como diferentes tipos de estímulos, incluindo o apelo sensual, afetam o comportamento do consumidor.
Livro de Jean Baudrillard: “A Sociedade de Consumo” como um texto teórico fundamental que explora como os produtos se tornam símbolos e como a publicidade usa essas simbologias.
Livro “Sex Sells: How Advertising Uses Sex to Sell Products” . Examina como a sensualidade é usada nas campanhas publicitárias.
Artigo sobre a história da Abercrombie & Fitch: “The Abercrombie & Fitch Controversy: A Case Study in Branding and Diversity”. Pode ser encontrado em diversas publicações acadêmicas e blogs de moda. Indico ainda o documentário que explica sobre os acontecimentos.
Artigo sobre a marca Calvin Klein por Mundo das Marcas








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